Após o vice presidente Hamilton Mourão (PRTB) dizer que “alguém” da oposição no Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) que seria o responsável por divulgar dados negativos sobre as queimadas no país, o pesquisador do instituto, Gilvan Sampaio, responsável justamente pelo monitoramento das queimadas, disse que “jamais faria manipulação de dados”.
Sem citar nomes ou apresentar provas, Mourão disse a jornalistas, na entrada do prédio da Vice-Presidência, nesta terça-feira (15) que “é alguém lá de dentro que faz oposição ao governo. Eu estou deixando muito claro isso aqui. Quando o dado é negativo, o ‘cara’ vai lá e divulga. Quando é positivo, não divulga”, Quando questionado sobre quem seria esse opositor, o vice-presidente desconversou: “Não sei, não sou diretor do Inpe”.
De acordo com o cientista do Inpe, na sexta-feira (11) o instituto enviou um esclarecimento ao gabinete do vice-presidente após ele negar incêndios na Amazônia.
“Sou servidor de carreira do Inpe e jamais faria manipulação de dados. O Inpe enviou na sexta um esclarecimento ao gabinete do vice-presidente. Como ele falou isso hoje, acredito que ainda não tenha chegado até ele”, disse o pesquisador, que ao assumir o cargo disse que não aceitaria manipular dados.
Para o vice-presidente do Sindicato Nacional de Gestores em Ciência e Tecnologia (SindCT), Fernando Morais, a acusação de Mourão deixa claro que existe uma tentativa de desmonte do Inpe.
“O entendimento do sindicato, que é também o da maioria dos servidores, é que existe um projeto de desmonte do Inpe. De extinção nas funções de satélite, de desmatamento, enfim. Querem desmontar o Inpe para que não haja contestação das coisas que eles querem fazer”, disse o sindicalista.
Fernando Morais ainda destaca que é infundada a acusação de uso político de dados pelos cientistas do instituto. “Pesquisador do Inpe, no geral, não quer saber de política. Eles sabem que a política não é a praia deles. Eles querem fazer ciência. São apolíticos. Não têm envolvimento. Não estão usando para fazer política nem politicagem. Estão defendendo a ciência e u instituto de ciência internacionalmente reconhecido”, disse.
Os dados sobre queimadas no país, na verdade, são públicos e estão disponíveis em uma página especial do Inpe na internet. Os números são alimentados diariamente, gerando relatórios automáticos sobre os focos em todos os biomas do país, o crescimento nos últimos cinco dias e a comparação com o mesmo período do ano anterior. No site do Inpe é possível ter dados nacionais, por estado e por bioma e ainda consultar os municípios com maior número de focos de incêndio.
Neste momento, os dados do Inpe mostram 133.974 focos de incêndio acumulados em todo país entre 1º de janeiro e 14 de setembro, um aumento de 13% em relação ao ano passado.
Só no Pantanal, os incêndios aumentaram 210% neste ano em comparação com o mesmo período de 2019, segundo relatório publicado dia 14 deste mês pelo Inpe. Entre 1º de janeiro e 12 de setembro, o número de focos de calor chegou a 14.489, contra 4.660 em 2019.
Mesmo a três meses do fim de 2020, esse já é o ano com o maior índice de queimadas para o bioma. O recorde anterior era de 2005, quando foram registrados 12.536 incêndios. Os números começaram a ser medidos em 1998.
A situação é tão grave que levou o governador do Mato Grosso do Sul, Reinaldo Azambuja (PSDB), a decretar situação de emergência. Ao menos 79 municípios do estado e 1,4 milhão de hectares foram atingidos, incluindo áreas de proteção ambiental e de preservação permanente.