Ex-ministro da Justiça, Miguel Reale Júnior, lidera o grupo; texto deve embasar juridicamente o relatório final do relator da investigação, senador Renan Calheiros (MDB-AL)
Grupo de juristas, que assessorou a CPI da Covid-19 no Senado, liderado pelo ex-ministro da Justiça Miguel Reale Júnior, entregou à cúpula da comissão, na última terça-feira (14), parecer que lista cinco sete eventuais crimes que podem ter sido cometidos por Jair Bolsonaro e integrantes do governo na gestão da pandemia.
O texto foi entregue ao relator do colegiado, Renan Calheiros (MDB-AL) e deve embasar juridicamente o relatório final, previsto para ser apresentado entre os dias 23 e 24 de setembro. Outros grupos da área jurídica também serão ouvidos pelos senadores nos próximos dias.
O documento aponta que Bolsonaro cometeu crimes de responsabilidade, de epidemia, de prevaricação, contra a humanidade, infração de medida sanitária, charlatanismo e incitação ao crime.
“Quanto aos crimes contra a saúde pública, no sentido de que há farto material para o oferecimento de denúncia contra o presidente e os demais agentes apontados pelos crimes comuns narrados, material que traz prova da materialidade dos delitos e indícios contundentes de suas autorias”, revela o documento.
O documento registra que, ao não tomar medidas “absolutamente necessárias” e ficar omisso diante da pandemia, o governo levou à morte centenas de milhares de pessoas no país o que conduz “à evidente responsabilização do desastre humanitário aos condutores da política de saúde no país”.
ENQUADRAMENTO PENAL
Além de Bolsonaro, o relatório aponta o possível enquadramento penal de atos cometidos pelo ex-ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, pelo ex-diretor de logística do Ministério da Saúde, Roberto Ferreira Dias, pelo ex-secretário executivo da Saúde, Elcio Franco, e pela ex-secretária de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde, Mayra Pinheiro.
No caso de alguns servidores do governo, o relatório aponta que “as provas colhidas pela CPI — fundamentalmente os depoimentos prestados —, revelam que alguns agentes públicos e privados investigados se reuniram com o intuito de praticar o crime de corrupção passiva”.
TIPIFICAÇÃO E LISTA DOS CRIMES
Há cinco capítulos no documento: Crime de Responsabilidade, Crimes contra a Saúde Pública, Crime contra a Paz Pública, Crimes contra a Administração Pública, Crimes contra a Humanidade e Conclusão.
De acordo com os juristas, “o Sr. Presidente da República, por atos normativos, atos de governo e conduta pessoal, conspirou, mormente ao longo de março e abril de 2020, contra as medidas sanitárias ditadas pela ciência, adotadas pelo Ministério da Saúde, até que no final de março, o ministro Henrique Mandetta envia carta ao mandatário em que anuncia o colapso do sistema se não houvesse mudança de atitude”.
O relatório mostra ainda que o presidente também “desrespeitou o direito à vida e à saúde de número indeterminado de pessoas, por via de atos comissivos, ao promover aglomerações, ao se apresentar junto a populares sem máscara; ao pretender que proibições de reuniões em templos por via de autoridades fossem revogadas judicialmente; ao incitar a invasão de hospitais, pondo em risco doentes, médicos, enfermeiros e os próprios invasores; ao incentivar repetidamente a população a fazer uso da cloroquina, dada como infalível, hidroxicloroquina e ivermectina, medicamentos sem eficácia comprovada e com graves efeitos colaterais; ao recusar e criticar o isolamento social e as autoridades que o impõe; ao sugerir que a vacina poderia transformar a pessoa em jacaré, desencorajando a população a se vacinar; ao postergar a compra de vacinas; ao ridicularizar os doentes com falta de respiração; ao ter descaso em face da situação trágica de Manaus no início deste ano, dando causa a trágica dizimação.”
DESIDIA
Os juristas também destacaram que Bolsonaro deixou de cumprir determinação do STF e da própria Constituição para assumir a coordenação do combate à pandemia e ressaltaram que, ao contrário do que vem dizendo o presidente, o próprio Supremo determinou que havia competência comum entre União, Estados e municípios.
Segundo Reale Júnior, a recomendação do parecer é pedir o indiciamento de Roberto Dias por corrupção e de Elcio Franco pelo crime de epidemia.
Mayra Pinheiro, segundo o documento jurídico, poderia ser acusada de curandeirismo pela atuação à frente da sua área com recomendação pelo uso de cloroquina, droga comprovadamente ineficaz contra Covid-19 promovida pelo Ministério da Saúde.
“Além disso, apontamos fatos que precisam de uma apuração mais efetiva, como aqueles que envolvem empresas intermediárias de vendas de vacinas, por exemplo”, comentou Reale Júnior.
O grupo de juristas se reuniu quarta-feira (15) com os senadores da CPI logo à tarde, após a reunião da comissão. A ideia dos integrantes da comissão é fazer série de reuniões com advogados e juristas para antecipar as discussões jurídicas em torno do relatório.
M. V.