Transformou cursinho de cinco dias de 2014 em “postgrado” na Universidad de La Coruña, na Espanha
Além de ter desenterrado sósias de Goebbels, terraplanistas, trumpetes e outras esquisitices desse tipo, o governo Bolsonaro será lembrado também como o que mais atraiu falsificadores de currículos. O desembargador Kássio Marques, escolhido para uma vaga no Supremo Tribunal Federal (STF), é mais um que admitiu que não fez um curso de pós-graduação na Universidad de La Coruña, na Espanha, como tinha divulgado antes.
Ele confessou sua “turbinada” do currículo num encontro com o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP). Mas tentou atribuir a informação falsa a um “erro”, um “problema na tradução”. O curso rápido – cinco dias – feito seis anos atrás seria, segundo Marques, um “postgrado”, o que ele diz ser um tipo de especialização sem paralelo com a pós-graduação nos moldes brasileiros. Não colou. O Decotelli está até hoje tentando “explicar” seu “postgrado”.
O fato é que, apesar dele tentar vender gato por lebre, a própria Universidad de La Coruña foi clara em sua resposta, referindo-se exatamente ao mesmo termo – “postgrado” – para afirmar que não houve o curso. “Informamos que a Universidade da Coruña não ministrou nenhum curso de pós-graduação com o nome de pós-graduação em Contratos Públicos”, declarou a entidade, em resposta enviada ao Estadão.
Aí, já tentando consertar o excesso de esperteza, ele jogou a culpa na tradução em conversa com o senador Randolfe Rodrigues, que o recebeu em sua casa na terça-feira (06). “Ele destacou que, no currículo que ele distribuiu, na documentação que ele distribuiu, não está relatado como pós-graduação, mas como ‘postgrado’, que é um curso e não é propriamente pós-graduação, em português, na formatação que conhecemos no Brasil”, explicou Randolfe.
Marques enviou ao TRF-1 (Tribunal Regional Federal da Primeira Região) e está publicado no site da Corte informando que o desembargador fez curso de “postgrado” em “Contratación Pública”, pela Universidad de La Coruña. A instituição, como dissemos, informou que não oferece nenhuma pós-graduação deste curso e esclareceu que Marques participou apenas, e como visitante, de um curso de cinco dias, realizado em 2014.
O pró-reitor de pós-graduação da USP, Carlos Gilberto Carlotti Junior, disse, em entrevista ao Estadão que, em geral, pós-graduação quer dizer mestrado ou doutorado. “Você pode chamar de especialização, estágio, curso de extensão, mas no meio acadêmico você não utiliza a expressão ‘pós-graduação’ para um curso tão pequeno como esse, a menos que você fale que é um curso de pós-graduação sensu lato”, disse.
Também, segundo o professor da USP, o termo “pós-doutorado”, que Kássio Marques informou que fez, se refere, em regra, a cursos que vem após a conclusão de doutorado. Ele completou o doutorado em setembro de 2020. “Se você fez algum estágio no exterior antes do doutorado, não é habitual você chamar de pós-doutorado. O termo pós-doutorado implica que é posterior ao doutorado.”