Ministro rebateu alegações usadas pelo indicado de Bolsonaro no STF para reverter a cassação do deputado estadual bolsonarista Fernando Francischini (PR). PT ingressou com recurso contra a decisão
O ministro do STF (Supremo Tribunal Federal), Alexandre de Moraes, rebateu, nesta sexta-feira (3), as alegações utilizadas pelo colega de Corte, Nunes Marques, para reverter a cassação, pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral), do mandato do deputado estadual bolsonarista Fernando Francischini (União Brasil-PR), por divulgar notícias fraudulentas sobre as urnas eletrônicas de 2018.
Sem citar a decisão de Marques, Moraes disse que o obstáculo “logo será superado” e que não se pode fazer é “política judiciária do avestruz”, durante participação no 8ª Congresso Brasileiro de Direito Eleitoral, organizado pelo Iprade (Instituto Paranaense de Direito Eleitoral).
“Este ano, nas eleições, independentemente de um obstáculo que logo será superado, logo mesmo, é isso que este ano nas eleições será aplicado no Tribunal Superior Eleitoral. Foram duas decisões em três processos. Para fins eleitorais, as plataformas, todos os meios das redes serão considerados meios de comunicação para fins de abuso de poder econômico e abuso de poder político”, disse Moraes.
ENFRENTAR O PROBLEMA
“Quem abusar por meio dessas plataformas, sua responsabilidade será analisada pela Justiça Eleitoral, da mesma forma que o abuso de poder político, de poder econômico pela mídia tradicional. Não podemos fazer a política judiciária do avestruz, fingir que nada acontece: que bonito, é uma empresa de tecnologia”.
Moraes, que vai presidir o TSE nas eleições de outubro, saiu em defesa da atuação do Judiciário diante das críticas de que houve criminalização da política.
“Não é que o Judiciário criminalizou a política. Setores da política se criminalizaram. O erro é confundir o continente com o conteúdo. O conteúdo, eventuais políticos que participaram de atos de corrupção devem ser punidos. Isso não pode afetar o continente, a importância do Legislativo para a democracia. Não existe democracia, Estado de Direito sem um Poder Legislativo forte”, pontificou Moraes.
UM DOS PRINCIPAIS ALVOS DE BOLSONARO
Moraes, que também conduz investigações sensíveis contra o governo, é um dos principais alvos de críticas do presidente Jair Bolsonaro (PL) ao Judiciário.
Bolsonaro aparece em segundo lugar nas pesquisas eleitorais, atrás do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), e tem repetido com frequência ataques ao sistema eletrônico de votação, sem apresentar provas de possíveis fraudes.
O presidente ataca também ministros do STF e do TSE, em algumas ocasiões insinuando que haveria interesse na eleição de Lula.
Bolsonaro, que já chegou a colocar em dúvida a realização das eleições deste ano, tem deixado claro sua tendência de que não reconhecerá o resultado do pleito em caso de derrota.
CASO VALDEVAN NOVENTA
Na mesma toada, a decisão de Nunes Marques também teve repercussão na Câmara dos Deputados. Desserviço à democracia, numa espécie de antipedagogia política.
Dessa forma, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), determinou nesta sexta-feira, o afastamento do deputado federal Márcio Macêdo (PT-SE) e a volta do mandato do parlamentar Valdevan Noventa (PL-SE), que havia sido cassado em março por abuso de poder econômico.
Na quinta-feira (2), após suspender a cassação do deputado estadual Fernando Francischini (União Brasil-PR), o magistrado fez o mesmo com Valdevan. Nos dois casos, Nunes Marques contrariou parecer do TSE.
RAZÕES DA CASSAÇÃO DE VALDEVAN
A cassação de Valdevan havia sido determinada, em 17 de março, após uma investigação que apontou captação irregular de recursos na campanha de 2018. Conforme a apuração, sergipanos foram coagidos a forjar doações para o deputado.
Naquele intervalo da campanha eleitoral, foram enviadas dezenas de transferências no valor de R$ 1.050 para o então candidato. A partir disso, os órgãos fiscalizadores suspeitaram da movimentação e conseguiram atestar casos de fraude.
Na decisão judicial, o ministro do STF, indicado por Bolsonaro, argumentou que Valdevan não teve a oportunidade de ter acesso ao recurso contra o julgamento — já que o acórdão ainda não foi publicado. Tanto o deputado federal quanto Francischini são apoiadores de Bolsonaro.
RECURSO ÀS DECISÕES
A Corte Suprema recebeu, nesta sexta-feira, dois recursos contra as decisões de Nunes Marques. Uma é do suplente de Valdevan e a outra é do PT.
Nos dois casos, a competência para analisar o tipo de ação usada é do presidente do STF, Luiz Fux.
Se houver recursos enviados ao próprio ministro Nunes Marques, o magistrado deve levar o tema para análise da 2ª Turma do STF, presidida por ele e formada por 5 dos 11 ministros.
ARGUMENTOS
No recurso, o PT sustenta que a decisão do ministro, que suspendeu a determinação do TSE, violou diversos entendimentos da própria Corte e gerará “grave lesão à ordem pública”.
“Essa decisão, com as devidas vênias, atenta contra os preceitos processuais e, gerará grave lesão à ordem pública, razão pela qual se utiliza da presente via de Suspensão de Liminar para requer desse eg. Supremo Tribunal Federal a restauração da decisão da Justiça Eleitoral”, escreveu a legenda.
O PT afirma que Nunes Marques suprimiu a competência da Justiça Eleitoral ao suspender a decisão do TSE. Para a sigla, o recurso apresentado pela defesa de Valdevan ainda não cumpria requisitos determinados em lei para ser apreciado pelo Supremo.
“A supressão de instância, no presente caso, viola a ordem pública, motivo pelo qual a decisão liminar do eg. Min. Nunes Marques deve ser cassada, pois representa uma afronta às regras processuais impostas, além de violar a competência do Tribunal Superior Eleitoral e o princípio da segurança jurídica”, está escrito no recurso.
MORAES ELEITO
O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), foi eleito para um novo mandato de dois anos como ministro do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
A votação foi realizada no início da sessão plenária do STF, na quarta-feira (1º). A duração do primeiro mandato expirava na quinta, dia 2 de junho.
O ministro foi reconduzido por um placar de 10 votos a 1, já que é tradição na Corte que o indicado não vote em si mesmo. A ministra Cármen Lúcia recebeu 1 voto.
Moraes assume a presidência do TSE em agosto deste ano, substituindo o ministro Edson Fachin. O magistrado ficará à frente do Tribunal até junho de 2024 e comandará o processo eleitoral deste ano.
O TSE é composto por sete ministros: três do Supremo, dois do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e dois juristas nomeados pelo presidente da República entre advogados de notável saber jurídico e idoneidade moral, a partir de lista tríplice indicada pelo STF.
Cada ministro é eleito para um biênio e é proibida a recondução após dois biênios consecutivos. O presidente do TSE é eleito entre os ministros oriundos do Supremo.
Alexandre de Moraes está no STF desde 2017. Ele tem doutorado em Direito do Estado, livre-docência em Direito Constitucional e atuou como promotor de justiça, advogado, professor e consultor jurídico. O ministro é autor de vários livros e artigos acadêmicos.