Segundo Greenpeace, mais de 300 embarcações atracaram no rio a apenas 100 quilômetros de Manaus após informação que havia ouro na região
O vice-presidente da República, Hamilton Mourão, anunciou uma operação conjunta da Polícia Federal e da Marinha contra ações ilegais do garimpo no Rio Madeira, no Amazonas. “A Polícia Federal e a Marinha já estão se preparando para agir”, disse Mourão a jornalistas em Brasília nesta quinta-feira, depois que centenas de balsas de garimpeiros atracaram próximo à comunidade de Rosário, no município de Atuazes, há cerca de 113 quilômetros de Manaus.
Mourão insinuou que os garimpeiros recebem apoio do narcotráfico em troca da proteção de suas rotas. “Nós temos tido vários informes de que o narcotráfico, essas quadrilhas que agem no Centro-Sul do país, na ordem de proteger suas rotas subiram para lá, e uma das formas de eles se manterem é apoiando ações dessa natureza. Até porque esse ouro é extraído ilegalmente e é um ativo que eles podem trocar por drogas”, afirmou.
Questionado se a ação da PF e da Marinha contará com a participação de órgãos de fiscalização ambiental, o vice-presidente chegou a citar o Ibama, mas em seguida defendeu que o mais importante neste caso é a presença da Marinha e que a força naval poderá apreender embarcações ilegais.
“A Marinha tem que, pô, verificar qual é a questão, quem está ali na legalidade, qual é a embarcação legal. E o pessoal que está na ilegalidade vai ter a embarcação apreendida”, completou o vice-presidente.
O Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas (Ipaam) admitiu, por meio de nota, que as atividades de exploração mineral na região não estão liberadas, portanto, se confirmadas, trata-se de uma ação ilegal.
Na quarta-feira (24), o Ministério Público Federal (MPF) expediu uma recomendação cobrando medidas emergenciais por meio de uma ação coordenada de repressão ao garimpo ilegal na calha do rio Madeira e afluentes para repressão e desarticulação ao garimpo ilegal, em atuação integrada por órgãos e autarquias federais e estaduais competentes, no prazo de 30 dias.
“Pelo porte da ‘invasão garimpeira’, a repressão eficiente da atividade exige, necessariamente, esforços coordenados de agências governamentais diversas, cada qual dentro de suas atribuições, com papel destacado para a atividade repressora e de policiamento ambiental dos órgãos integrantes do Sisnama (Sistema Nacional do Meio Ambiente) – o Ibama, em nível federal, e o Ipaam, em nível estadual”, afirma trecho da recomendação”.
No entanto, até o momento, nenhuma ação concreta foi identificada para retirar os garimpeiros da área invadida. Ao portal G1, os órgãos de controle e fiscalização informaram que estavam apurando a situação.
O Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas (Ipaam) informou, nesta quarta-feira (24), que está realizando um levantamento para planejar as ações pertinentes na sua esfera de atuação, integradas aos demais órgãos estaduais e federais.
O Ipaam disse ainda que informaria ao comando da Segurança Pública do Amazonas (SSP), as ações ilegais, além de pedir apoio federal para apurar a ocorrência.
Por seu turno, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) informou que teve ciência do caso e, que, já teria se reunido nesta terça-feira (23), com o Ipaam para a adoção de medidas cabíveis e para coordenar uma fiscalização para o garimpo na região.
A Polícia Federal comunicou que tem conhecimento das atividades ilícitas em exercício no Rio Madeira, e “juntamente com outras instituições, estabelecerá as melhores estratégias para o enfrentamento do problema e interrupção dos danos ambientais”.
Em agosto deste ano, a Justiça Federal condenou o Ipaam a anular as licenças concedidas irregularmente para as atividades de extração de ouro no leito do rio Madeira, em área de mais de 37 mil hectares, na região sul do Amazonas.
A sentença, que permanece válida, reforçou uma decisão liminar de dezembro de 2017 nesse mesma direção. A medida determina que toda a atividade garimpeira antes amparada por essas licenças irregulares deve seguir paralisada. A ação que originou a sentença é do Ministério Público Federal (MPF) em ação civil pública. Atualmente, o processo está em fase de recurso.
As autoridades não explicaram a razão de as dragas irregulares não terem sido impedidas até agora. O ativista do Greenpeace Danicley de Aguiar denunciou que a falta de fiscalização permitiu o avanço da atividade ilegal.
“Nós estamos vendo aqui um conjunto de mais de 300 balsas colocadas numa ponta de rio, sem licença ambiental alguma, mas operando naturalmente à luz do dia sem ser incomodada por ninguém”, observou. “São 300 balsas a menos de 30 minutos de voo da maior cidade da Amazônia e elas colocam aí em risco também toda a saúde pública da região”, criticou Aguiar.
Ataques aos direitos dos indígenas e fortalecimento do garimpo ilegal
Ao longo do seu governo, é notório o descaso e a omissão do governo Jair Bolsonaro em relação à garantia, proteção e atenção aos direitos dos povos indígenas e ribeirinhos.
Em abril deste ano, lideranças indígenas dos povos Mura, Maraguá, Karipuna, Kanamari, Makuxi e Guarani e Kaiowá denunciaram o governo brasileiro à ONU, durante a 20ª Sessão do Fórum Permanente de Assuntos Indígenas das Nações Unidas.
Os indígenas denunciaram a total paralisação das demarcações de terras indígenas, a intensificação de conflitos territoriais e invasões em seus territórios, além do deliberado descaso na atenção à saúde durante a pandemia de covid-19, que tem desproporcionalmente afetado os povos indígenas brasileiros, acusando o governo Bolsonaro de prática de genocídio.
A Instrução Normativa 09/2020, publicada em abril do ano passado pela Fundação Nacional do Índio (Funai) autoriza a certificação de propriedades privadas sobre terras indígenas que aguardam homologação. Essa medida permite a empresas e fazendeiros a cerificação de propriedades situadas em áreas indígenas, mesmo no caso daquelas em estágio avançado de homologação. Ou seja, permitindo a sua comercialização e, consequentemente, fomentando os conflitos e a grilagem.
Outra investida contra os povos originários, é o Projeto de Lei nº 191/2020, de autoria do governo federal, que tramita na Câmara dos Deputados e já recebeu o aval da comissão de Minas e Energia. A proposta visa regulamentar a exploração de recursos minerais, o garimpo, a extração de hidrocarbonetos e a utilização de recursos hídricos para a geração de energia elétrica dentro de terras indígenas.
Em outubro deste ano, em visita a um garimpo ilegal na terra indígena Raposa Serra do Sol, no município de Uiramutã, em Roraima, Bolsonaro legitimou a ação dos garimpeiros. “Esse projeto (PL 191/2020) não é impositivo): “se vocês quiserem plantar, vão plantar. Se vão garimpar, vão garimpar. Se quiserem fazer algumas barragens no vale do rio Cotingo, vão poder fazer”, assegurou.
Outro exemplo da política de extermínio dos povos indígenas, a Resolução 04/2021, também publicada pela Funai, mas revogada pelo Supremo Tribunal Federal (STF), em março deste ano, por sua óbvia ilegalidade, estabelecia “critérios de heteroidentificação” para avaliar a autodeclaração de identidade dos povos indígenas. Com isso, o governo buscava impor barreiras para dificultar o reconhecimento da identidade de populações indígenas e dificultar, assim, o acesso a políticas públicas – entre elas, a vacinação.