A Frente Polisário e o executivo da República Árabe Sahauri Democrática (RASD) – mais conhecida como Saara Ocidental – chamaram de “imprudente” o anúncio de Trump, já com um pé fora da Casa Branca, contrário à autodeterminação da nação em favor do ocupante Marrocos, já que, como assinalaram, esta soberania não é assunto dele e “continua a ser propriedade exclusiva do povo saharaui”
Trump anunciou na semana passada, pelo Twitter, o ‘reconhecimento’ da soberania de Marrocos sobre o vizinho Saara Ocidental, ex-colônia espanhola, em troca da normalização de relações diplomáticas de Rabat com o regime Netanyahu. “Outro avanço histórico hoje! Nossos dois grandes amigos Israel e o Reino de Marrocos concordaram em relações diplomáticas plenas – um avanço massivo para a paz no Oriente Médio!”
A que se seguiu declaração da Casa Branca sobre a moeda de troca, que afirma que “[um] Estado saharaui independente não é uma opção realista para resolver o conflito e que a autonomia genuína sob a soberania marroquina é a única solução viável.”
Com exceção dos EUA agora, praticamente nenhum país reconheceu a anexação pelo Marrocos do Saara Ocidental, que a ONU considera um dos 16 territórios do planeta ainda pendentes de descolonização. O direito à autodeterminação dos saarauis também foi reconhecido pela Corte Internacional de Haia há mais de 40 anos.
No sábado (12), a Rússia advertiu que a medida tomada pelo governo Trump “desencadeará uma nova onda de violência na região” e dificultará os esforços da ONU para solucionar o conflito através de um referendo.
Desde 1991 estava em vigor uma trégua entre as duas partes sob auspícios da ONU, com a criação da Missão das Nações Unidas para o Referendo no Sahara Ocidental (MINURSO), para dar prosseguimento à decisão popular sobre a independência ou a anexação.
Anteriormente, em prol de salvar Netanyahu da cadeia, Trump já havia ‘doado’ o Golã sírio ocupado a Israel, subvertido o status da Jerusalém ocupada e patrocinado o ‘acordo do século’ do Oriente Médio, tentando impor um batustão palestino. Trump também chantageara o Sudão, para que reatasse com Israel, em troca da retirada da lista dos EUA de ‘países patrocinadores de terrorismo’.
Apontando que o anúncio de Trump foi feito no Dia Internacional dos Direitos Humanos, os líderes saharauis denunciaram também que o ato viola “o direito dos povos à autodeterminação”.
Eles afirmaram ainda que o ato do presidente pato manco dos EUA mina “os esforços da comunidade internacional e da União Africana para encontrar uma solução justa e pacífica entre os dois Estados membros da UA”.
A Frente Polisário e a RASD exortaram a ONU e a UA a pressionarem Rabat para que ponha fim ao seu colonialismo no Sahara Ocidental, reiterando o seu empenho em continuar a lutar contra a ocupação.
QUATRO DÉCADAS DE OCUPAÇÃO
O Saara Ocidental foi invadido em 1975 por tropas marroquinas, que agiram para impedir a independência, sob liderança da Frente Polisário. A intervenção da monarquia marroquina forçou centenas de milhares a se refugiarem na Argélia, situação que perdura até hoje.
Os feudais marroquinos compartilham com Trump a fixação em muros. Construíram um, de 2.000 quilômetros de extensão, separando a região que ocupam das áreas já libertada pela Frente Polisário, onde foi proclamada a república dos saarauis. Rabat deslocou milhares de marroquinos para a área ocupada, que é rica em depósitos de fosfatos.
Em outubro último, o secretário-geral da Frente Polisário e presidente da República Árabe Saharaui Democrática (RASD), Brahim Ghali, denunciou o rompimento do cessar-fogo por tropas marroquinas e chamou à mobilização para defender a república ameaçada.