O professor israelense Meir Baruchin relata, em entrevista ao portal “Democracy Now!”, as perseguições que sofreu por se opor ao assassinato em massa de civis palestinos na Faixa de Gaza, em sua maioria mulheres e crianças
No dia 9 de novembro, a polícia israelense vasculhou a casa do professor Meir Baruchin e o levou preso. Também apreenderam seu telefone e dois laptops. A polícia interrogou-o sob a acusação de ato de traição e de intenção de perturbar a ordem pública.
Baruchin ficou preso por quatro dias, rotulado como detido de alto risco. A perseguição não parou por aí. Solto, foi demitido da escola onde lecionava e ainda enfrenta acusações que podem levá-lo à prisão.
Apesar disso e de todas as ameaças, Meir Baruchin recusou-se a permanecer em silêncio e deu a seguinte entrevista ao portal “Democracy Now!”, entrevista comandada pela renomada jornalista Amy Goodman:
Amy Goodman – Senhor Meir Baruchin, bem-vindo ao Democracy Now! Foi difícil para nós entrar em contato com você nos últimos dias porque seus dispositivos eletrônicos, como seu telefone, foram levados. Você pode falar exatamente sobre o que aconteceu com você? O que você postou? E então, como a polícia israelense saqueou sua casa?
Meir Baruchin – Em primeiro lugar, obrigado por me receberem.
Quando cheguei ao primeiro interrogatório, fui apresentado a 14 postagens, a maioria delas antes de 7 de outubro. Houve postagens de quatro anos atrás, de dois anos atrás. Apenas uma ou duas postagens foram posteriores a 7 de outubro.
O que tenho tentado fazer em minhas postagens no Facebook é isso. Para a maioria dos israelenses, os palestinos são imagens realmente vagas. Eles não têm nomes, nem rostos, nem família, nem esperança, nem planos. E estou tentando dar-lhes nomes e rostos, apresentá-los aos israelenses, para que mais pessoas possam ver os palestinos como seres humanos. Então é isso que eu faço no meu Facebook. A polícia não gostou, então me prenderam.
Juan González– E quando você foi preso, qual foi o conteúdo do interrogatório contra você naquele período? E como você foi tratado?
Meir Baruchin – No dia 9 de novembro, recebi um telefonema da polícia para um interrogatório sobre ‘sedição’. Liguei para o meu advogado e ele disse que, para interrogar um cidadão israelense por sedição, seria necessária a aprovação do Procurador-Geral. A polícia pediu aprovação, mas foi rejeitada, então decidiram me interrogar por intenção de cometer um ato de traição e perturbar a ordem pública.
No minuto em que entrei na delegacia, eles algemaram minhas mãos e pernas e me mostraram um mandado para revistar minha casa. Cinco detetives me levaram para minha casa e vasculharam o local. Depois fui levado de volta à delegacia para o primeiro interrogatório, que durou quatro horas. Depois disso, fui levado para a prisão. Como você disse, fui classificado como detento de alto risco, separado de todos. Eu não tinha permissão para trazer nada comigo, um livro ou algo assim. Passei lá quatro dias. Para não enlouquecer, fazia exercícios a cada uma hora e meia, duas horas.
Na noite de domingo, 12 de novembro, me levaram para um segundo interrogatório. E a técnica deles era… não era realmente fazer perguntas. Foi mais uma retórica. Quando você instala a resposta dentro da pergunta, você não deixa a outra pessoa escolher sua própria resposta. Por exemplo, eles disseram algo como: “Como alguém que justifica e legitima os estupros cometidos pelo povo do Hamas em 7 de outubro, você não acha que…” – você sabe, essa era a técnica deles. Também no meu segundo interrogatório, em determinado momento disseram que minhas postagens no Facebook são como Os Protocolos dos Sábios de Sião. Agora, sou professor de história, então perguntei a eles: “Vocês já leram Os Protocolos dos Sábios de Sião?” Não houve comentários.
Fui levado de volta para a prisão. E no dia 13 de novembro fui libertado pelo juiz, e mesmo assim me mantiveram na prisão por mais três horas e meia.
Juan González – E qual tem sido a resposta dos colegas professores em Israel e da imprensa à sua prisão e detenção?
Meir Baruchin – A maior parte da grande mídia aceita a declaração do porta-voz da polícia que me acusou de estar justificando e legitimando os estupros cometidos pelas pessoas do Hamas em 7 de outubro.
Quanto aos meus colegas professores, centenas deles estão me dizendo: “Meir, estou totalmente com você, mas tenho filhos para sustentar”, “Meir, estou com você, mas estou pagando uma hipoteca”, “Meir, estou com você, mas minha filha vai se casar”, “Meir, estou com você, mas acabamos de começar a redecorar a casa”. Eles têm medo de falar. Eles têm medo de perder o emprego. Eles veem muito claramente que hoje em dia os cidadãos israelenses que demonstram algum, o menor sentimento pelo povo de Gaza, opondo-se ao assassinato de civis inocentes, estão sendo perseguidos politicamente, passam por vergonha pública, perdem seus empregos, estão sendo colocados na cadeia. Então eles estão com medo.
Amy Goodman – Na semana passada, o Haaretz, jornal israelense, publicou um editorial chamado: “Prendendo árabes e esquerdistas: Como Israel pretende acabar com as dissidências domésticas sobre a guerra em Gaza”. Nele, o Haaretz escreveu sobre o seu caso, dizendo, entre aspas: “Não se engane: Baruchin foi usado como uma ferramenta política para enviar uma mensagem política. O motivo da sua prisão foi a dissuasão – silenciar qualquer crítica ou qualquer indício de protesto contra a política israelense. Baruchin pagou um preço pessoal.” Então, Meir, você pode falar sobre o fato de ter sido demitido do emprego? Você tem quatro filhos, certo? E também, quão incomum é a sua prisão e confinamento solitário, tanto para judeus israelenses quanto para palestinos?
Meir Baruchin – Bem, primeiro, devo admitir que o fato de ser judeu desempenhou um papel fundamental na minha prisão. Se eu fosse palestino, seria completamente diferente. Haveria muito mais violência por parte dos policiais e também na prisão por parte dos guardas.
Acho que é uma mensagem clara não apenas para os professores, mas para todos os cidadãos israelenses. Um dos jornalistas de Yedioth Ahronoth, Ben-Dror Yemini, me chamou de “soldado a serviço da propaganda terrorista”, com essas palavras específicas. Outros jornais – outros jornalistas também aceitaram a declaração policial sem obter a minha resposta ou mesmo sem tentar contestar a declaração policial.