Governo Bolsonaro privilegia vacinas importadas de multinacionais enquanto Anvisa cria repetidos entraves para a concessão do registro definitivo da vacina produzida pelo Butantan
O Instituto Butantan suspendeu a produção da CoronaVac, a vacina contra covid-19 elaborada em parceira com o laboratório chinês Sinovac devido à falta de demanda de novos lotes por parte do governo federal, que decidiu não incluir o imunizante no Plano Nacional de Imunização (PNI).
O imunizante, o primeiro a ser aplicado no Brasil, não é produzido pelo Butantan desde outubro de 2021, e não há previsão de retomada, segundo informou o instituto paulista.
Em abril deste ano, o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, anunciou o fim da emergência sanitária pela covid-19 no país e, com isso, apenas vacinas com registro definitivos na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) podem ser utilizados em adultos. Neste cenário, a CoronaVac passou a ser usada apenas em crianças e adolescentes.
Enquanto a Anvisa cria repetidos entraves para a concessão do registro definitivo da vacina, que é uma das mais utilizadas no mundo contra o coronavírus, o governo Bolsonaro sabota a aplicação da CoronaVac e privilegia vacinas importadas de grupos multinacionais.
As outras três vacinas aplicadas no Brasil já contam com registro definitivo pela Anvisa: Pfizer, AstraZeneca e Janssen.
Queiroga disse em entrevista ao portal UOL que o imunizante ainda é útil para o esquema vacinal primário (ou seja, as primeiras duas doses), mas alega que a falta de registro definitivo é um empecilho para comprar mais doses do Butantan.
“Como na população brasileira mais de 70% tem o esquema vacinal primário, o emprego da CoronaVac como [dose de] reforço não tem comprovação científica. Ela é utilizada hoje para imunização de crianças de 5 a 11 anos e para adolescentes, com forma de registro emergencial”, afirmou.
Uma pesquisa feita no Chile confirmou que a CoronaVac, em crianças, pode prevenir mais de 90% das internações pela covid-19. O Ministro ainda afirmou que se a CoronaVac conseguir o registro definitivo da Anvisa, será possível considerá-la como opção ao Ministério da Saúde.
“Havendo registro definitivo da Anvisa, apresentando os dados completos de que a vacina possa ser usada como reforço, é possível que o Ministério da Saúde considere essa opção”, disse o ministro.
O Instituto Butantan deve entregar novas análises da eficácia da vacina que foram solicitadas pela Anvisa na primeira quinzena de julho. O Butantan, entretanto, afirma que a eficácia da CoronaVac na dose de reforço ou terceira dose já foi comprovada cientificamente por estudos na China, Turquia e Chile.
A Anvisa trava ainda o pedido de uso da CoronaVac para aplicação em crianças de 3 a 5 anos. A liberação da vacina foi pedida pelo Butantan no dia 11 de março deste ano e desde então, o instituto aguarda a decisão do órgão federal.
DECISÃO POLÍTICA
A CoronaVac foi alvo de repetidos ataques por parte do governo Jair Bolsonaro que tentou desqualificá-la desde as primeiras tentativas de registro realizadas pelo governo de São Paulo pelo governador João Doria (PSDB).
Queiroga negou influência política na decisão de não comprar novas doses. “As questões sempre foram técnicas. Não tem questão política na escolha de vacinas. Quando se compra qualquer vacina, medicamento, tem de se considerar a segurança, eficácia e efetividade”, alega Queiroga, fingindo não enxergar que a aplicação da vacina foi uma das principais responsáveis por frear os altíssimos índices de mortalidade da pandemia no Brasil.
O que evidencia na prática a preferência do governo Bolsonaro em importar vacina ao comprar o imunizante produzido no país é o percentual de vacinados com a primeira e segunda dose do esquema vacinal, com a CoronaVac.
De acordo com dados da plataforma Vacinômetro Covid-19, do Ministério da Saúde, com números são referentes aos registros feitos até o dia 19 de junho, as proporções de doses aplicadas de cada imunizante disponibilizado no Brasil são:
- Janssen – 42,55% do total
- AstraZeneca – 30,42%
- Pfizer – 25,48%
- CoronaVac – 1,36%
- Não Informado – 0,19%