Sobre o comportamento do presidente da República, que colide com as orientações do Ministério sobre as medidas protocolares que antecedem à imunização, o ministro tangenciou responder diretamente. Em relação à não nomeação da médica Luana Araújo, Queiroga também escapuliu da resposta direta
Com as não-respostas ou tangenciações do ministro da Saúde, Marcelo Queiroga à CPI da Covid-19, nesta terça-feira (8), sobre o comportamento nada exemplar do presidente da República, parece não restar dúvida que quem comanda a pasta não é o ministro, mas o presidente.
Queiroga, que é médico, sabe que depois dos imunizantes, as medidas mais eficazes para evitar o contágio pela Covid-19 são o distanciamento social, o uso de máscara em locais públicos e o uso de álcool gel. Entretanto, Bolsonaro além de não seguir esses protocolos básicos ainda os desestimula. Numa clara atitude de sabotagem às medidas.
O relator da CPI, Renan Calheiros (MDB-AL) o questionou sobre essas práticas. “Vossa excelência havia dito a esta CPI que sua chegada ao ministério representava uma sinalização de mudança de posicionamento do governo federal acerca dos assuntos como distanciamento social, adoção de medidas de higienização e de vacinação”, lembrou.
“No dia de sua posse como ministro [em 23 de março], 298.843 pessoas já haviam falecido pela Covid-19, e agora já nos aproximamos, infelizmente, dos 480 mil óbitos”, comparou o relator.
BOLSONARO SE COMPORTA AO CONTRÁRIO
“Em relação às medidas não farmacológicas, eu tenho tido uma determinação pessoal em recomendá-las. E essas recomendações são para todos — todos os brasileiros, sem exceção. Não há exceção”, disse.
“O cuidado é individual, o benefício é de todos. Aqui eu digo de maneira clara e textual: o Ministério da Saúde tem, de maneira clara, se manifestado acerca desse ponto”, acrescentou o ministro.
Renan: “O que lhe foi orientado e dito por ele?”.
Tangenciando as respostas diretas, o ministro disse que o “presidente da República não conversou comigo acerca da atitude dele.” “Eu sou ministro da Saúde. Eu não sou um censor do presidente da República”, escapuliu novamente o ministro.
“Eu faço parte de um governo. O presidente da República não é julgado pelo ministro da Saúde. As recomendações sanitárias estão postas. Cabe a todos aderir a essas recomendações”. Bolsonaro não adere e deixa o ministro publicamente em “saia justa” diante da opinião pública.
Sobre os protocolos básicos de proteção Queiroga disse: “No Ministério da Saúde, primeira atitude minha como ministro, senador Humberto Costa (PT-PE), foi editar uma portaria obrigando o uso de máscaras no Ministério da Saúde, porque nós julgamos isso importante.”
NÃO NOMEAÇÃO DE LUANA ARAÚJO
A não nomeação da médica infectologista para Secretaria Extraordinária de Combate à Covid-19, Luana Araújo, também expressa que o ministro não tem autonomia total à frente da pasta.
Ao ser questionado sobre por que não efetivou a profissional, o ministro tangenciou a resposta, como se estivesse querendo ou tentando esconder algo que não pode ser admitido. Daí advém, permanentemente, o questionamento de que o ministro, efetivamente, não comanda a pasta.
“Anteriormente à indicação da doutora Luana Araújo ao Ministério da Saúde, vossa excelência tinha conhecimento sobre suas firmes posições contrárias ao chamado ‘tratamento precoce’ da Covid?”, perguntou Renan. “Não, não tinha conhecimento”, disse o ministro.
“Sobre essa validação de nomes, eu vou voltar para mostrarmos o que já foi dito aqui com as próprias declarações da doutora Luana. Pergunto, ministro: as nomeações para o Ministério da Saúde passam pelo crivo de algum outro órgão do Governo Federal?”, questionou Renan.
“Eu desisti do nome da doutora Luana porque eu vi que o nome dela não estava suscitando o consenso que eu desejava”, evadiu-se o ministro.
A médica esteve à frente da Secretaria de Combate à Covid-19 por cerca de 10 dias, mas não foi nomeada porque, tudo indica, não passou pelo crivo do chamado “gabinete das sombras” em razões de as posições dela não coadunarem com a linha negacionista comandada pelo presidente da República, que em última instância parece ser o decisor final.
MARCOS VERLAINE (colaborador)