O ministro da Educação do governo Bolsonaro, Abraham Weintraub, lançou, na quarta-feira (17), o programa intitulado “Future-se” que tem como objetivo criar mecanismos para a privatização das instituições federais de ensino.
Dentre os principais pontos do programa está a criação de um fundo imobiliário (constituído a partir da venda de imóveis da União) para o financiamento das universidades federais, a transferência da gestão das instituições para Organizações Sociais (OSs) e o aumento da captação de recursos do setor privado para financiar projetos, como locação e venda de prédios e espaços públicos.
O projeto ainda propõe a venda dos nomes de campi e edifícios das universidades para empresas privadas.
O lançamento do “Future-se” ocorre em meio ao bloqueio de verbas das universidades, anunciado no fim de abril pelo governo. De acordo com a associação que representa os reitores das universidades federais, a Andifes, a medida atinge até 54% dos recursos que podem ser cortados das universidades federais.
FUNDO
Segundo o governo, o principal ponto do projeto é a constituição de fundos imobiliários que administrariam recursos oriundos da venda de imóveis que são patrimônio da União. A ideia é arrecadar, por meio de contratos de cessão de uso, concessão, fundos de investimento e parcerias público-privadas, R$ 50 bilhões para o financiamento das universidades.
Importante destacar que o recurso prometido é inexistente, já que, segundo o ministério, o dinheiro da venda do patrimônio público seria investido em fundos imobiliários – e seriam os rendimentos desses fundos especulativos que seriam repassados ao orçamento das instituições.
“O Ministério da Educação poderá participar como cotista de fundos de investimento, a serem selecionados mediante procedimento simplificado. Esses fundos de investimento deverão ter natureza privada e patrimônio próprio separado do patrimônio do cotista e do administrador, sujeitando-se a direitos e obrigações próprias”, diz o texto apresentado pelo governo.
Durante a apresentação, o secretário de educação superior, Arnaldo Lima, citou como exemplo de rentabilidade a transformação de um terreno de uma universidade federal em um shopping center.
ORGANIZAÇÕES SOCIAIS
De acordo com o projeto do governo, a gestão das universidades deixaria de estar a cargo das reitorias e seria transferida para “Organizações Sociais”, entidades privadas que passariam a administrar o conjunto das universidades. O modelo é o mesmo adotado para a privatização de equipamentos públicos de saúde no país.
“Ao aderir ao FUTURE-SE, a Ifes [Instituição Federal de Ensino Superior] se compromete a: utilizar a organização social contratada para o suporte à execução de atividades relacionadas aos eixos de gestão, governança e empreendedorismo; pesquisa e inovação; e internacionalização”, diz a apresentação do governo.
E mais:
“O FUTURE-SE será operacionalizado por meio de contratos de gestão, firmados pela União e pela Ifes, com uma organização social, cujas atividades sejam dirigidas ao ensino, à pesquisa científica, ao desenvolvimento tecnológico, à cultura e estejam relacionadas às finalidades do Programa. Os contratos de gestão poderão ser celebrados com organizações sociais já qualificadas pelo Ministério da Educação ou por outros Ministérios, sem a necessidade de chamamento público, desde que o escopo do trabalho esteja no âmbito do contrato de gestão já existente”.
NAMING RIGHTS
O projeto prevê ainda a possibilidade de autorização de naming rights, quando o nome de empresas e patrocinadores pode aparecer em nomes da instituição, como acontece com estádios de futebol e casas de show. Por exemplo: Credicard Hall ou Allianz Parque.
“As Ifes do programa FUTURE-SE estão autorizadas a conceder a pessoas físicas ou jurídicas o direito de nomear uma parte de um bem, móvel ou imóvel, de um local ou evento, em troca de compensação financeira (“naming rights”).A autorização para esta ação deverá ser precedida de estudo que demonstre que o preço de mercado da imagem da Ifes e a proposta apresentada pela pessoa física ou jurídica representa ganhos para a instituição.”
Além dos fundos especulativos e das Organizações Sociais, o “Future-se” prevê:
- Estabelecer limite de gasto com pessoal das universidades, conforme estabelecido pelo comitê gestor do programa.
- Transformar atividades de extensão universitária em atividades culturais para receber incentivos via Lei Rouanet.
- Estabelecimento de metas de captação de recursos privados para as instituições. A adesão ao projeto submeterá as universidades federais a riscos e mudanças de prioridades, porque captar recursos precisará ser uma meta.
- Remunerar de forma privada professores com publicações em revistas de ponta e possibilidade de registro de patentes em nome deles.
- Professores em regime de dedicação exclusiva poderão exercer atividade remunerada de pesquisa na organização social contratada pela universidade, desde que cumpram sua carga horária ordinária.
PRODUTO
“A gente quer se transformar na Apex da Educação”, disse Arnaldo Lima, referindo-se à Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos, que organiza feiras e eventos ao redor do mundo para promover a produção industrial e agrícola brasileira.
“A gente está querendo exportar a indústria de conhecimento que a gente tem. A educação brasileira pode ser um produto de exportação”, disse Arnaldo.
“Queremos sair das amarras da Lei 8.666”, disse Lima, em referência à Lei de Licitações, que define as regras para uma contratação pública.
Segundo o ministro, a medida deve solucionar a crise financeira vivida por algumas instituições. Crise esta causada pelo próprio governo, com seu corte orçamentário, defendido a unhas e dentes por Weintraub e seus asseclas, ou “acepipes”, se assim preferir o ministro bolsonarista.
Na prática, o governo de Bolsonaro aponta, como solução para a Educação, jogar todo o patrimônio das universidades brasileiras nas mãos dos amigos de Paulo Guedes.
Mas, qual o problema disso?
O desenvolvimento de pesquisa ter que estar atrelado aos interesses do povo, ao público, não à vontade de alguns parasitas financeiros.
Com o “Future-se”, o desenvolvimento científico brasileiro ficaria à mercê da vontade dos fundos especulativos e multinacionais, que estão cheias de vontade de fazer a sangria de conhecimento e recursos do setor público.
O artigo 207 da Constituição Federal prevê que as universidades gozam de “autonomia didático-científica, administrativa e de gestão financeira e patrimonial”. Isso significa que nem o MEC, nem o setor privado, podem intervir nos planos de ensino, pesquisa e extensão determinados pelas instituições, o que torna o projeto inconstitucional.
Weintraub diz ainda que alunos da graduação não terão de pagar mensalidade nas universidades públicas, independentemente da faixa de renda. “Sem mensalidade, sem nada”, disse o ministro.
Entregar a gestão, o investimento, ou a posse de terrenos e prédios das universidades federais para o setor privado, é privatização.
A cobrança de mensalidade é apenas o próximo passo do plano.
MAÍRA CAMPOS
Veja o texto apresentado pelo governo