Uma câmera de segurança flagrou um rapaz de 24 baleado a queima roupa por um policial militar na noite do último sábado (2) em Vitória, capital do Espírito Santo. O ajudante de pedreiro Weliton da Silva Dias, de 24 anos, foi baleado no peito e no abdômen pelo PM e não resistiu.
Nas imagens, Weliton aparece em um beco, quando o atirador chegou. Ele levantou os braços e, mesmo assim, o PM atirou à queima roupa. Atingido por dois tiros no peito, ele não resistiu aos ferimentos. Familiares não sabem se ele morreu no beco onde foi baleado ou quando deu entrada no Pronto Atendimento em Vitória.
Uma auxiliar de produção, parente da vítima e contou que ninguém entendeu porque Weliton levantou os braços e mesmo assim foi morto pelo militar.
Em um outro vídeo, o atirador aparece aparentando nervosismo. Quando algumas pessoas se aproximaram, ele fez gestos com a mão. Weliton era casado há nove anos e tinha um filho de seis.
Ainda, em um dos vídeos divulgados na última terça-feira (5) pela Associação de Cabos e Soldados do Espírito Santo, é possível ouvir parte do que aconteceu. O policial pediu para Welinton colocar a mão na cabeça.
“Levanta! [trecho inaudível] Mão na cabeça, vai, vai, vai”, disse o PM.
Depois, vem o som dos tiros. O policial se abaixou e pareceu revistar o rapaz. O outro militar entrou e saiu de cena. Moradores chegaram ao local e começou uma gritaria.
Em um trecho, dá para ouvir o policial dizendo que há uma arma. “Se alguém quer socorrer, socorre, mas a arma tá aqui”, disse o agente. A família do jovem disse que ele não estava armado. Alguém pediu para tirar a arma para socorrer o jovem: “tira a arma para gente socorrer”.
Depois, outro som de tiro é ouvido. O policial pediu uma faca: “pega uma faca lá, corre”.
O outro vídeo, mostra a ação por outro ângulo. Weliton aparece caído no chão, de costas. O policial estava ao lado dele. “Socorre ele, gente”, disse alguém no local.
Depois, há um trecho inaudível da fala do PM.
O registro dos policiais no boletim de ocorrência diz que “para assegurar a sua vida, o cabo efetuou dois disparos” e que depois dos tiros “foi necessário cortar a bandoleira para tirar o armamento do alcance do infrator e que após a arma ser retirada um grupo de pessoas levou Weliton do local”.
O boletim segue dizendo que “depois o rapaz foi localizado no pronto atendimento do bairro São Pedro”.
CAPIXABAS EXIGEM JUSTIÇA
Diante do ocorrido, o Conselho Estadual de Igualdade Racial do estado solicitou uma reunião com Renato Casagrande para tratar da questão da política de segurança pública. “A sociedade capixaba exige uma atitude do governador”, cobra a União de Negros e Negras pela Igualdade no Espírito Santo (Unegro-ES), que faz parte do Conselho, em suas redes sociais.
Para o representante da Unegro no Conselho Estadual de Igualdade Racial, Wellington Barros, não se pode aceitar que “um representante do Estado julgue, condene e execute qualquer pessoa. É inconstitucional, não têm respaldo do Código Penal, afinal, a pena de morte não faz parte do mesmo”.
Wellington destaca que a política de segurança pública adotada pelo governo do Estado é “sem respeito aos direitos humanos”, “uma política de morte”, além de promover a “criminalização da pobreza, pois isso não acontece em áreas nobres”. Ele também defende a desmilitarização da PM, que de acordo com ele, “é treinada para a guerra, para ver o outro como inimigo”.
“Não admitimos! Não nos calaremos! Não nos adaptaremos a barbárie. Mais um jovem assassinado pela polícia, cuja missão é proteger. Mais um negro assassinado com a vênia do Estado e a omissão de ampla parcela da sociedade civil. O Brasil é um Estado beligerante e em guerra contra a maior parcela de seu povo. Exigimos que se cumpra a Constituição e a Lei”, disse a Unegro em nota.
A Defensoria Pública do Espírito Santo encaminhou, na última segunda-feira (4), um ofício ao Comando Geral da Polícia Militar, solicitando informações sobre a morte de Welinton. A instituição informou que deu início a um procedimento de apuração do caso, por meio das coordenações de Direitos Humanos e Penal, para adotar as medidas administrativas ou judiciais cabíveis.
A instituição informou que deu início a um procedimento de apuração do caso, por meio das coordenações de Direitos Humanos e Penal, para adotar as medidas administrativas ou judiciais cabíveis.
Revoltados com a ação policial, os moradores da região iniciaram um confronto com a polícia. Garrafas e outros objetos foram usados como arma. Os militares revidaram e efetuaram novos disparos de balas de borracha. Durante o conflito, um ônibus foi incendiado.
Um morador chegou a ser baleado na perna durante a confusão. Ele recebeu atendimento médico e já teve alta.
GOVERNO EXIGE APURAÇÃO
Na segunda, o governador Renato Casagrande (PSB) postou nas redes sociais que determinou a “investigação sumária do fato”. Casagrande disse que confia nas forças policiais e que “qualquer tipo de excesso não ficará impune”.
De acordo com a Secretaria de Estado da Segurança Pública e Defesa Social (Sesp), Weliton tinha oito passagens pela polícia, entre os anos de 2012 e 2019, por crimes como porte ilegal de arma de fogo, ameaça, desacato ou resistência à ação policial e tráfico de entorpecentes.
O secretário de Segurança Pública, coronel Márcio Celante Weolffel, informou que o caso está sendo apurado e que os dois militares envolvidos na ocorrência tiveram as armas recolhidas e foram afastados de suas funções.
“Nós determinamos ao comandante-geral da PM a instauração de um inquérito policial militar para averiguação e investigação de todas as circunstâncias do fato ocorrido na data de ontem e o recolhimento das armas dos policiais militares e o afastamento preventivo cautelar das atividades operacionais”, disse o secretário em um vídeo divulgado na tarde do último domingo (3).
Ainda de acordo com o secretário, o prazo para que as investigações sejam concluídas é de 60 dias.
“Toda morte é lamentável. Dentro do Programa Estado Presente nós buscamos a preservação da vida e a redução no número de homicídios”, declarou o secretário.