“Hoje, as fake news não fazem parte só das eleições, mas do convívio social, da vida, como se realiza na esfera pública”, avaliou a ex-deputada gaúcha do PCdoB
A ex-deputada federal Manuela D‘Ávila (PCdoB-RS) afirmou ao HP que a legislação de combate às fake news, que já está em tramitação na Câmara dos Deputados, deve focar na investigação contra “quem produz e distribui massivamente a desinformação”.
“O que vimos acontecer no último período, principalmente durante a pandemia, foi a distribuição de desinformação de forma massiva e legitimada por agentes públicos, o que comprova que isso está muito além da questão eleitoral, mas faz parte da forma como a extrema-direita no mundo se utiliza para levar a cabo os seus objetivos”, afirmou.
Em entrevista à Hora do Povo, Manuela disse que o Projeto de Lei de combate às fake news (2630/20), que tem a relatoria de Orlando Silva (PCdoB-SP), é uma oportunidade de defender a democracia e a sociedade contra as mentira e a desinformação.
“Hoje, as fake news não fazem parte só das eleições, mas do convívio social, da vida como se realiza na esfera pública”, avaliou.
“Orlando tem conseguido dialogar com os setores da sociedade civil e também prospectar soluções que não sejam amarradas, mas que garantam que tenhamos condições de punir quem produz e distribui [fake news]”, continuou a ex-deputada.
Manuela D’Ávila também disse que é positiva a intenção do relator do PL de implementar “algum grau de moderação das plataformas, a partir das plataformas, mas com regras claras” definidas por um Comitê Gestor, “respeitando o direito de defesa e imaginando que as pessoas possam ter as publicações recolocadas”.
O Projeto de Lei também enfrenta “o tema do serviço de mensagerias, que é como nós chamamos o WhatsApp e Telegram, que é um tema absolutamente complexo, mais do que o das plataformas como Facebook e Instagram”.
“Orlando tem conseguido dialogar com os setores da sociedade civil e também prospectar soluções que não sejam amarradas, mas que garantam que tenhamos condições de punir quem produz e distribui [fake news]”
Orlando Silva já informou que pretende implementar, a partir de seu relatório, ferramentas de investigação sobre a produção das fake news parecidas com o grampo telefônico. A partir de uma ordem judicial, as informações de uma determinada mensagem ou conta poderão ser guardadas para investigação.
LIBERDADE DE EXPRESSÃO
A ex-deputada federal rebateu a argumentação bolsonarista de que o combate às fake news restringe a liberdade de expressão: “não é nada disso. Esse projeto garante a liberdade de expressão nos termos da Constituição Federal de 1988”.
“Como esperar meses com uma publicação que imediatamente tem um alcance de milhões de pessoas? Como esperar meses para removê-la se ela faz com que pessoas morram, como é o caso das publicações que negam a importância da vacina ou que subestimam vírus?”
“Ele não estabelece nenhum tipo de censura. O que caracteriza a censura? A proibição de publicação de conteúdos”, argumentou.
“Tudo continuará sendo publicado. Agora, assim como preconiza a Constituição quando trata de liberdade de expressão, as pessoas são responsáveis por aquilo que publicam e devem assumir essa responsabilidade. As plataformas, com regras claras, também são corresponsáveis por isso”, pontuou.
Manuela D’Ávila avalia que a viralização das fake news é rápida e as ferramentas para combatê-las também devem ser ágeis.
“Como esperar meses com uma publicação que imediatamente tem um alcance de milhões de pessoas? Como esperar meses para removê-la se ela faz com que pessoas morram, como é o caso das publicações que negam a importância da vacina ou que subestimam vírus?”, questionou.
STF E TSE COMBATEM FAKE NEWS
Em uma decisão histórica, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) cassou o mandato do deputado estadual do Paraná, Delegado Francischini (PSL), por ter divulgado fake news durante as eleições.
Os ministros advertiram que a prática não será tolerada nas eleições de 2022, sob pena de cancelamento do registro do candidato.
No Supremo Tribunal Federal (STF) corre uma investigação contra o grupo bolsonarista que produz e distribui fake news e ofensas contra as instituições democráticas, como a própria Corte.
Para Manuela D’Ávila, “quando eles [TSE e STF] tomam a dianteira, eles mostram em primeiríssimo lugar que, sim, é possível fazer muito marco legal já existente”.
“Muita gente, motivada por um desejo legítimo de justiça, acha que nós deveríamos ir atrás das centenas de milhares de pessoas que compartilham notícias falsas. Ocorre que essas pessoas são vítimas também”
“Eles focam naquilo que eu considero o alvo certo, que é investigar quem produz e distribui massivamente a desinformação. O STF e o TSE nos dizem que é possível identificar quem produz, quem financia e quem distribui, que é, ao fim ao cabo, quem nós temos que mirar”, completou.
Manuela, que foi alvo de fake news produzidas industrialmente em diversos momentos de sua vida pública, como na sua candidatura à vice-presidência da República, em 2018, e à Prefeitura de Porto Alegre, em 2020, acredita que as pessoas que compartilham as notícias falsas também “são vítimas” e devem ser protegidas e educadas.
“Muita gente, motivada por um desejo legítimo de justiça, acha que nós deveríamos ir atrás das centenas de milhares de pessoas que compartilham notícias falsas. Ocorre que essas pessoas são vítimas também”.
“Teve uma única fake news a meu respeito, por exemplo, que atingiu treze milhões de pessoas em dois ou três dias em 2018. Em 2020, nós tiramos [de circulação] uma que um dia atingiu 500 mil, em uma eleição de uma cidade com 1,4 milhão de habitantes”, explicou.
PEDRO BIANCO