Era na Alerj que o ex-assessor do então deputado estadual Flávio Bolsonaro, hoje senador, operava o que teria rendido muito dinheiro à família do presidente da República
Ex-assessor do senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), Fabrício Queiroz, filiou-se na quarta-feira (30) ao PTB para ser candidato nas eleições de outubro. Queiroz é apontado como operador do esquema de ‘rachadinhas’ no gabinete de Flávio, quando este era deputado estadual.
Ele não descarta a possibilidade de se lançar à vaga na Alerj (Assembleia Legislativa do Rio), onde a prática criminosa teria ocorrido.
A Executiva nacional do PTB, no entanto, ainda avalia se o nome de Queiroz cairia melhor como candidato à Câmara dos Deputados.
O nome de Queiroz não era unanimidade no partido, já que o presidente da legenda, Marcus Vinícius, entendia que o nome dele poderia trazer desgaste para a legenda nas eleições. No entanto, o nome agrada o presidente de fato do partido, Roberto Jefferson, que endossou o convite feito anteriormente.
Ou seja, ele deve ingressar na legenda sob a chancela de Jefferson, que atualmente está em prisão domiciliar, em razão de fazer ameaças à democracia, ao STF (Supremo Tribunal Federal) e aos ministros da Corte.
PECULATO
Segundo promotores, Queiroz seria o operador do esquema de ‘rachadinhas’ e fazia pagamentos das contas pessoais de Flávio e da família dele. O senador usava loja de chocolates para receber os recursos e depois os retirava como se fosse lucro.
Relatório do Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) indicou saques e depósitos na conta de Queiroz entre janeiro de 2016 e janeiro de 2017 que somam R$ 1,2 milhão. Em três anos somaram mais de R$ 7 milhões.
‘Rachadinha’ é o apelido abrasileirado do peculato. No caso, é o sequestro de salários ou parte dos salários de assessores ou funcionários, fantasmas ou não, de parlamentares.
O peculato é a modalidade de crime que ocorre quando o servidor, por ter acesso em razão do cargo, destina valores ou bens para finalidade estranha à administração pública.
Queiroz é amigo de mais de 40 anos de Jair Bolsonaro, desde quando eram do Exército.
Jair Bolsonaro, três de seus filhos e sua ex-esposa, Ana Cristina Valle, são investigados por terem praticado “rachadinha” nos gabinetes.
Relatos ao Ministério Público mostram que foi Jair Bolsonaro quem montou o esquema no gabinete dos filhos, escolhendo os operadores e mandando demitir quem não devolvia todo o dinheiro que ele queria.
Um áudio da ex-cunhada de Jair Bolsonaro, Andréa Siqueira Valle, mostra ela contando que seu irmão, André, trabalhou no gabinete do atual presidente e era pressionado por ele para devolver uma parte cada vez maior de seu salário.
“O André deu muito problema porque ele nunca devolveu o dinheiro certo que tinha que ser devolvido, entendeu? Tinha que devolver R$ 6 mil, ele devolvia R$ 2 mil, R$ 3 mil. Foi um tempão assim até que o Jair [Bolsonaro] pegou e falou: ‘Chega. Pode tirar ele porque ele nunca me devolve o dinheiro certo’”, relatou Andréa.
A própria Andréa foi assessora de Flávio Bolsonaro, onde participou do esquema de rachadinha. “Eu ficava com mil e pouco e ele ficava com sete mil reais”, contou.
Segundo relatos, como o do ex-assessor de Flávio, Marcelo Luiz Nogueira dos Santos, contam que Jair Bolsonaro substituiu Ana Cristina Valle do comando do esquema das rachadinhas por Fabrício Queiroz, depois de ter problemas com ela.
BOLSONARISTAS DISPERSOS
Os deputados bolsonaristas do Rio de Janeiro se dispersam por até quatro partidos. PL, PTB, PP e MDB são apontados como destinos dos cerca de 20 parlamentares federais e estaduais, quase todos eleitos pelo PSL em 2018, que apostam em reeditar campanhas alinhadas Jair Bolsonaro (PL) para buscar mais quatro anos de mandato.
No geral, pelo menos 40 deputados federais e estaduais do Rio devem se movimentar durante a janela, que permite a migração de sigla sem perda de mandato até o dia 1º de abril. O União Brasil, partido criado pela fusão entre DEM e PSL, deve perder 15 parlamentares fluminenses nesta janela, e pretende filiar outros seis candidatos à recondução ao Legislativo.
O PL, que filiou Bolsonaro em novembro, vai ser o principal destino da bancada bolsonarista no Estado. A previsão é que o partido receba ao menos sete dos 12 deputados federais apoiadores do presidente da República, hoje no União Brasil, e outros sete estaduais.
OUTROS RUMOS
Há nomes ligados à militância bolsonarista, contudo, que tomarão outros rumos. O deputado federal Daniel Silveira, por exemplo, que chegou a ser preso em 2021 por ameaças a ministros do STF, optou por filiar-se ao PTB e avalia possível candidatura ao Senado. Silveira está no União Brasil.
À época da prisão dele determinada pelo STF, e ratificada em votação no plenário da Câmara, o PL orientou a favor de referendar a decisão da Corte Suprema. O PTB orientou contrariamente à prisão.
“SE DEUS QUISER”
Em entrevista recente, após três anos em silêncio sobre o caso em que é investigado, Queiroz disse que “se Deus quiser” vai provar a “inocência” dele e negou a existência de ‘rachadinhas’.
Em 7 de setembro do ano passado, ele participou de ato em apoio Bolsonaro. As manifestações tinham pautas antidemocráticas, entre essas, ameaças a ministros do STF e, também, ao Congresso Nacional.
Queiroz alegou ainda que deixou o Rio de Janeiro por medo de ser morto. O eventual crime, segundo ele, teria o intuito de culpar Jair Bolsonaro. “Seria queima de arquivo para cair na conta do presidente, como aconteceu com o capitão Adriano (da Nóbrega)”, afirmou o ex-assessor em alusão ao miliciano morto em operação policial na Bahia em 2020.
ESCRITÓRIO DO CRIME
Adriano é apontado como líder do chamado Escritório do Crime, uma das mais poderosas milícias do Rio. De acordo com o Ministério Público, ele também estaria implicado no esquema das rachadinhas no antigo gabinete de Flávio.
E tudo levar a crer que o chefe-mor desse esquema era ninguém mais que Jair Bolsonaro, quando exercia o mandato de deputado federal.
ACREDITEM SE QUISER
Queiroz também negou ter contato pessoal com Frederick Wassef, advogado da família Bolsonaro, e disse que só o conhece pela TV. O policial militar afirmou que ficou na casa do defensor em Atibaia, no interior de São Paulo, apenas para realizar tratamento de saúde.
Wassef, por sua vez, o abrigou para proteger o presidente da República, segundo o ex-assessor.
Na entrevista, disse ainda que Wassef não é o “Anjo” mencionado em mensagens trocadas com familiares sem expressão direta ao nome do advogado. O MP do Rio, no entanto, obteve áudio da mulher de Queiroz, Marcia Aguiar, que vincula diretamente o defensor à alcunha.
M. V.
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