O Programa de Cisternas, responsável por fornecer mais de 1 milhão de unidades de acesso à água a famílias que convivem com a seca, viu seu orçamento encolher 96% durante o governo Jair Bolsonaro (PL). A redução é em comparação com 2014.
No primeiro ano de mandato de Bolsonaro, em 2019, o programa encolheu 74% em relação a 2018 e não chegou a entregar 9.000 cisternas.
A quantidade de unidades entregues em 2022 foi menor do que o volume de construções feitas em 2004, quando o projeto foi iniciado no primeiro mandato de Lula (PT).
A queda das verbas destinadas a essa política pública vinha desde antes do governo Bolsonaro, mas se acentuou na gestão do ex-presidente.
O auge do projeto ocorreu em 2014, quando 149 mil reservatórios foram entregues no mandato de Dilma Rousseff.
O levantamento, feito pela Folha de S.Paulo a partir de dados do governo federal, leva em conta a 1ª água – que corresponde às cisternas de 16 mil litros construídas para consumo humano-, a 2ª água -cujas tecnologias armazenam 52 mil litros de água para produção de alimentos- e as cisternas escolares.
A retomada do projeto Água para Todos, que inclui o Programa de Cisternas, esteve entre as promessas de campanha de Lula em 2022.
Com a posse de Lula na Presidência, em janeiro, o novo governo passou a falar em promover uma auditoria nos gastos do antecessor nesse item do Orçamento federal.
Após a denúncia de que famílias beneficiárias do programa foram enganadas e tiveram que pagar parte das construções das tecnologias sob a gestão de Bolsonaro, o Ministério do Desenvolvimento Social anunciou que iria investigar a aplicação de recursos no Programa de Cisternas no governo anterior, revendo contratos e apurando suspeitas de mau uso do dinheiro público.
Antes, a nova gestão já havia dito que suspenderia o contrato com a entidade que cobrou indevidamente de moradores pela construção das unidades, no interior de Minas Gerais. A responsável pelo contrato era a Ceapa (Central das Associações de Agricultura Familiar), com sede em Alagoas.
“No total são 45 instrumentos, ao custo de R$ 1,4 bilhão, sendo 30 considerados prioritários em análise pelo Tribunal de Contas da União”, diz o ministério, que fala em “enorme passivo”.
Segundo o coordenador do programa Um Milhão de Cisternas, da Articulação Semiárido Brasileiro (ASA), Rafael Neves, instituição que influenciou a criação de políticas públicas voltadas para o acesso à água, houve perseguição sob a gestão Bolsonaro.
“Eles veem o PT na gente e isso não é verdade. Nós já fizemos ato público contra um tipo de política da Dilma, por exemplo, quando ela começou a fazer cisternas de plástico. Quem propôs o programa fomos nós. O que o governo Lula fez [nos anos 2000] foi reconhecer que era uma boa ação e o tornou parte do governo como política”, disse Neves.
Essa tecnologia se tornou de grande importância em regiões do país como o semiárido mineiro, onde a estiagem pode durar até nove meses ao ano. Quem convive com a seca precisa estocar comida e, principalmente, água.
O armazenamento de água é importante não apenas para o consumo humano, mas para a criação de animais e o cultivo de alimentos. Por isso, políticas de acesso à água influem no combate à fome no país, especialmente em comunidades isoladas.
Sem acesso a sistema de água encanada, as famílias são obrigadas a percorrer quilômetros em busca de abastecimento nas cabeceiras dos rios.