Na última terça-feira (28), ministras de Estado, 21 prefeitas e parlamentares integrantes da Bancada da Frente Nacional de Prefeitos (FNP) no Congresso Nacional reuniram-se em Brasília para falar sobre a participação das mulheres em espaços de poder e de decisão política. O encontro foi organizado pela FNP e pelo Instituto Alziras, uma organização sem fins lucrativos.
No evento, mulheres ligadas à política e à gestão pública defenderam políticas de superação da pobreza e de enfrentamento a todas as formas de violência de gênero nas cidades brasileiras.
No Brasil de 2023, apenas 12% dos municípios são governados por mulheres; a bancada feminina da Câmara é composta por 91 deputadas, 18% de um grupo majoritariamente masculino. Esses números foram citados em diversas intervenções de prefeitas e ministras de Estado.
PESQUISE COMO UMA MULHER
A ministra da Ciência, Tecnologia e Inovação, Luciana Santos, defendeu a implementação de políticas públicas para combater a desigualdade de gênero na ciência. A ministra destacou que o MCTI está empenhado em promover o acesso, a permanência e a ascensão das mulheres nas carreiras científicas e tecnológicas.
“Nosso lema é ‘Pesquise como uma mulher’. Somos 60% da iniciação científica, mas não conseguimos permanecer na carreira ou ocupar espaços de liderança”, afirmou.
Diante desse cenário, a ministra Luciana Santos lembrou que o MCTI prepara edital do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) no valor de R$ 100 milhões para apoiar projetos que estimulem o ingresso e a formação de meninas e mulheres nas Ciências Exatas, Engenharias e na Computação.
Ela comentou ainda a recriação da Secretaria de Ciência e Tecnologia para o Desenvolvimento Social, que promove programas voltados à popularização da ciência, uma agenda que pretende trabalhar com os municípios, afirmando que é a secretaria que mais se comunica com as prefeituras, de modo que “as escolas possam ter acesso ao desenvolvimento tecnológico 4.0, que é robótica, a microeletrônica, a impressora 3D”.
SOMOS A MAIOR PARTE DA POPULAÇÃO
“Não queremos mais ser pioneiras. Nós queremos ser corriqueiras na empresa, corriqueira no governo, corriqueira em todo canto. Tem que ser corriqueiro ver mulheres nos espaços”, afirmou a ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva.
“Somos a maior parte da população, mas estamos completamente ‘menorizadas’”, disse Marina Silva, lembrando que as mulheres são mais gregárias, com tecnologia social que tem mais facilidade para compartilhar a autoria do que fazem. “É preciso compartilhar a autoria. Na lógica patriarcal, tudo converge para eles”, afirmou.
Marina Silva afirmou que tem como prioridade trabalhar com o racismo ambiental. “Temos que abarcar novos conceitos para enfrentar várias agendas e queremos ser corriqueiras nas empresas, no governo nos espaços.”
Das onze ministras do governo Lula, oito participaram da reunião, reforçando a importância da representatividade de mulheres no exercício de cargos de poder. Nesse cenário, de acordo com dados compilados pela Gênero e Número a partir do Tribunal Superior Eleitoral, as eleições de 2020 fizeram apenas dez prefeitas pretas e apenas uma mulher indígena, situação abordada pelas ministras Sonia Guajajara, dos Povos Indígenas, e Anielle Franco, da Igualdade Racial.
“Nossa presença indígena, a nossa presença mulher, ainda causa, muitas das vezes, impacto em determinados lugares”, ressaltou Guajajara que também chamou atenção para o racismo e machismo sofridos pelos povos originários.
Para além da baixa representatividade racial, Anielle também usou seu espaço de fala para abordar a questão da violência política. “Não basta a gente eleger prefeitas maravilhosas como vocês que estão aqui e colocar ministras potentes. A gente precisa cuidar e quando a gente fala do cuidar, temos que cuidar umas das outras”, disse.
Em sua fala, a ministra das Mulheres, Cida Gonçalves, antecipou que vai fazer uma marcha contra a misoginia, que começa quinta-feira (30) em Campo Grande, e vai percorrer outras cidades brasileiras, até abril.
A ministra pediu que as prefeitas se juntem ao movimento para combater a discriminação da mulher por preconceito contra o sexo feminino e disse que não é possível haver tanta misoginia em um país com o tamanho do Brasil, que tem mulheres ministras, prefeitas, vereadoras e deputadas. “Ter tanto ódio contra as mulheres e que, muitas vezes, nos calem. Basta que comecemos a ter voz que nos calam, nos fazem ficar quietas.”
Cida Gonçalves ainda destacou as 40 ações lançadas pelo governo federal no Dia Internacional da Mulher, no Palácio do Planalto, como a igualdade salarial. “O governo federal precisa da adesão das prefeituras para garantir os direitos das mulheres. Venham a Brasília para a gente negociar”, estimulou a ministra.
Durante o encontro, a ministra da Saúde, Nísia Trindade, reconheceu que as mulheres estão sub-representadas nas instâncias de poder em todas as esferas, nas instituições de pesquisa e no setor privado. Para a ministra, a luta é pela representatividade de 50%. Nísia defendeu também a agenda de pautas contra a discriminação e a violência, como um todo, em especial a violência obstétrica. Nísia citou ainda pautas que considera centrais, como a da saúde integral em todas as etapas da vida da mulher, dos direitos reprodutivos e sexuais e sobre relações com o corpo de mulheres e meninas. “Juntas, podemos mais, juntas, somos fortes”.
A ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco, destacou o fato de mulheres negras serem apenas 4% das prefeitas do país e pediu adesão delas à reformulação e restruturação do Sistema Nacional de Promoção da Igualdade Racial (Sinapir) para melhorar as condições de vida da população negra. Anielle convocou as mulheres para combater a violência de gênero na política e lutar pela paridade de gênero e racial.
“Que tenhamos cada vez mais mulheres prefeitas, vice-prefeitas, governadoras, ministras. E, por que não pensarmos, mais uma vez, em uma presidente, uma vice-presidente? Para isso, a gente precisa se fortalecer, e se fortalecer significa cuidar uma da outra.”
A ministra da Cultura, Margareth Menezes, destacou a reativação e reabertura ao diálogo do setor cultural, que emprega 7 milhões de pessoas no Brasil. “Estamos recebendo a todas, são bem-vindas. E a gente pode ampliar [a presença da mulher] na política, dar um voto de confiança às mulheres do Brasil. Somos uma força de representatividade gigante, para transformar políticas mais dirigidas a nós. Precisamos combater o feminicídio, dentro da democracia, com educação para todos.”
ENFRENTAR A FOME
A prefeitas Moema Gramacho, de Lauro de Freitas (BA), vice-presidente de Políticas de Gênero da FNP, falou sobre violência política e a necessidade de proposição coletiva entre representantes de todos os entes federados para enfrentar a fome e a pobreza extrema, além disso reforçou que as mulheres precisam estar presentes na discussão sobre reforma tributária, porque, “precisa taxar grandes fortunas e não o consumo, cestas básicas ou aquilo que as mulheres consomem mais”.
Já a prefeita de Palmas (TO), Cinthia Ribeiro, lembrou da articulação e mobilização pela aprovação da PEC 158/2019, que institui a licença maternidade para deputadas e senadoras. “É importante conquistarmos um espaço igualitário e a garantia da licença maternidade é um dos passos que damos em direção à equidade na política”, destacou. Cinthia também falou sobre o pedido da FNP para que a essa proposta de emenda acrescente a garantia a prefeitas e vereadoras.
Para a deputada Lídice da Mata, ex-presidente da FNP e integrante da bancada que a entidade lançou recentemente no Congresso, a importância de se debater essa temática está no fato de que as mulheres são “cidadãs de direitos iguais” e, por isso, precisam estar representadas igualmente nos espaços de poder. “O parlamento não pode ser uma expressão da democracia do nosso país se as mulheres não estiverem democraticamente eleitas e ocupando seu espaço de poder na sociedade”, disse.