Cerca de 250 organizações de movimentos negros convocaram um ato nacional para o dia 24 de agosto próximo em protesto ao assassinato da líder quilombola Mãe Bernadete, ocorrido no último dia 17, na Região Metropolitana de Salvador. A data escolhida é o aniversário de morte do advogado e abolicionista Luís Gama.
Em nota, a Coordenadoria Ecumênica de Serviço (CESE), com sede em Salvador, lamentou o brutal assassinato da líder comunitária. “A CESE acompanhou a luta incansável desta grande líder para salvaguardar seu território, suas tradições religiosas e culturais e também sua busca por justiça pelo assassinato de seu filho Binho, ocorrido no dia 19 de setembro de 2017 no mesmo Quilombo”.
“Em diversos momentos as lágrimas e o grito por justiça e por vida digna de Mãe Bernadete calaram fundo nos nossos corações”, completou a CESE.
A vítima foi morta ao ter sua casa, no Quilombo Pitanga dos Palmares, município Simões Filho (BA), invadida por dois homens armados que disparam 12 vezes contra ela. Mãe Bernadete, que era sacerdotisa do candomblé, foi enterrada ao lado de seu filho Flavio Gabriel Pacífico dos Santos, conhecido como Binho do Quilombo, que também era líder quilombola e foi morto da mesma maneira que sua mãe, em 2017.
Há duas semanas, quando esteve com a ministra Rosa Weber, do STF, Mãe Bernadete pediu mais segurança. Ela lembrou o assassinato do filho, que continua em aberto. Também relatou ameaças que vinha sofrendo.
“Recentemente, perdi um outro amigo e amiga de quilombo também. É o que nós recebemos: ameaças. Principalmente de fazendeiros e de pessoas da região. Hoje vivo assim: não posso sair que estou sendo revistada, minha casa é toda cercada de câmeras, me sinto até mal com um negócio desses”, disse para a ministra.
O governo da Bahia está revisando todos os protocolos de proteção de defensores de direitos humanos após o assassinato da líder comunitária, segundo o secretário de Justiça e Direitos Humanos da Bahia, Felipe Freitas. Ele informou que equipes do governo estadual e do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania estão atuando juntos para definir com os órgãos de segurança pública o aperfeiçoamento dos programas de proteção. “É uma tragédia”.
“A morte de uma defensora de direitos humanos é uma tragédia, ainda mais se ela já tenha sido ameaçada. O governo federal e o governo da Bahia estão revisando, obviamente não só na Bahia, como em todo o Brasil, todos os protocolos de proteção”, disse Freitas à Agência Brasil.
“Uma tragédia como essa precisa fazer com que a gente aprimore o programa, aprimore as medidas de proteção, aperfeiçoe as ações de policiamento em todo o país”, disse, neste domingo (20), completou.
O secretário informou ainda que as equipes estão em campo reforçando a segurança de ativistas da comunidade e da região. Familiares de Mãe Bernadete foram retirados do Quilombo Pitanga do Palmares como medida de proteção.
Por meio de nota no sábado (19), o Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania informou que, ainda nesta semana, a Coordenação-Geral do Programa de Proteção aos Defensores de Direitos Humanos irá à Bahia para “cumprir agenda voltada ao fortalecimento do programa de proteção no estado”. Os representantes do governo federal farão visitas a comunidades ameaçadas para reunir informações com vistas a reformulação dessa política pública.
Nesta segunda-feira (21), representantes das polícias Civil e Federal se reuniram em Salvador para discutir ações para localizar e prender os assassinos de Bernadete Pacífico, a Mãe Bernadete. O encontro aconteceu na sede da Secretaria da Segurança Pública, na capital baiana.
OPERAÇÕES INVASIVAS
Os manifestantes querem defendem também que o Supremo Tribunal Federal (STF) proíba “operações policiais com caráter reativo” e “grandes operações invasivas em comunidades sob pretexto do combate ao tráfico”. As entidades defendem também a criação de uma lei federal que torne obrigatório o uso de câmeras em uniformes de agentes armados estatais e privados, a exemplo de São Paulo e outros estados, no caso da Polícia Militar.
Os movimentos reivindicam ainda um projeto em âmbito nacional de indenização e apoio aos familiares de vítimas do Estado e a federalização da investigação de chacinas policiais, entre outros pontos. O ato está sendo articulados pela Uneafro Brasil, o Movimento Negro Unificado (MNU), o Geledés – Instituto da Mulher Negra, entre outras organizações.